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sexta-feira, março 08, 2024

Ruy Cinatti nasceu há 109 anos

(imagem daqui)
    
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
    

   

  

Linha de Rumo
  
 
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em meu redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
 
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campo de flores
E silvas...
 
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
  
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado,
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
   
  
Ruy Cinatti

José Blanc de Portugal, poeta, geólogo, meteorologista e crítico musical, nasceu há cento e dez anos

(imagem daqui)
    
D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos diretivos na sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que lecionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo posteriormente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respetivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.
Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernando Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em, por ordem de publicação: francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.
  

 

Ode a Lisboa


Ó cidade, ó miséria
Ó tudo que entediava
Meus dias perdidos no teu ventre
Ó tristeza, ó mesquinhez cativa
Ó perdidos passos meus cansados
Ó noites sem noite nem dia
Ó dias iguais às noites
Sem esperança de outros melhor haver
Ou, pior, esperando alguém que não havia
Ó cidade, ó meus amigos idos
(tive-os eu ao menos como tal um dia dia?)
Ó cansaço de tudo igual a chuva e o céu azul imenso
Igual em toda a volta, meses de calor,
Ou água suspensa, nuvens indistintas
Ou cordas de chuva a não poupar-me!
Igual, igual, igual por toda a banda
Ó miséria de sempre!
Tua miséria, ó cidade
Minha miséria igual em tudo
Igual às tuas ruas cheias
Igual às tuas ruas desertas
Igual às tuas ruas de dia
Igual às tuas ruas de noite
Igual à dos teus grandes
E das tuas prostitutas
Igual às dos teus homens corrompidos
E,
piormente igual à dos teus sábios!

Ó cidade igual inigualada
Por que te chamo perdidamente igual?

Tua miséria não é miséria,
Tua tristeza não é tristeza
Tudo que me perdeste para ti não é perdido:
Meus passos firmaram-te as pedras;
Tuas noites foram o meu sol;
Teus dias me foram descanso...
Iguais, dias, noites, minha desesperança
Era o próprio esperar doutras certezas:
A certeza de só poder tornar-se
O alguém que é forçoso haver!

Os meus amigos idos
Por tal seriam por certo perdidos
Sei — como não? que existiram:
Lá estão.

Ó cidade! o cansaço seguiu-me
— não era teu.
Igual o tempo está comigo
— não era teu...
Igual, igual, igual por toda a banda. . .
A miséria, o desalento aqui os tenho
— Também não eram teus.

Mas a gente era tua e eu também.
Lá ficou; e eu,
Ó cidade, ó miséria,
Ó tudo que me entediava,
Meus dias perdidos no teu ventre!...
Sei que nada me pertence
É tudo teu!
E eu me glorifico por eu e os meus
Sermos só de ti que és de Deus!

 

José Blanc de Portugal

quarta-feira, janeiro 31, 2024

Luis de Montalvor nasceu há 133 anos...



Luís de Montalvor (S. Vicente, Cabo Verde, 31 de janeiro de 1891 - Lisboa, 2 de março de 1947), pseudónimo de Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, poeta e editor português
 
Vida

Filho de um magistrado, aos dois meses de idade foi viver para Lisboa. Aí fez os seus estudos e iniciou a sua atividade cultural. Fundou as revistas Orpheu, em 1915, e Centauro, em 1916, e foi colaborador das revistas Atlântida (1915-1920), Contemporânea (1915-1926) e Sudoeste (1935).

Em 1933, fundou a "Editorial Ática, Lda.", com sede numa pequena loja na rua das Chagas, em Lisboa, e que a partir dos anos 40 adotou a firma de "Ática, S.A.R.L., Casa Editora".

Pouco depois da morte de Fernando Pessoa, foi Luís de Montalvor quem convenceu a família do então quase desconhecido poeta (até aí só haviam sido publicados poemas avulsos em revistas de pequena circulação e a Mensagem em livro) do valor imenso da sua obra, praticamente inédita. Os herdeiros de Pessoa confiaram então a Montalvor e a João Gaspar Simões a tarefa de inventariar o espólio literário que o escritor deixara guardado numa arca, fechada no seu quarto do apartamento da Rua Coelho da Rocha.

Durante os anos seguintes, os dois escritores, paciente e graciosamente, organizaram os manuscritos pessoanos, tendo em 1942 sido publicado pela editora Ática as Poesias de Fernando Pessoa, primeiro dos cinco volumes constituintes das Obras Completas de Fernando Pessoa – sendo os restantes: Poesias de Álvaro de Campos (1944), Odes de Ricardo Reis (1945), Mensagem (1945) e Poemas de Alberto Caeiro (1946).

Segundo Gaspar Simões, instigado por sócios mais ambiciosos, Montalvor em dezembro de 1946, inaugurou, na rua Garrett nº 2, em pleno Chiado, as instalações luxuosas e ampliadas da editora-livraria, com espaços para conferências e exposições de arte moderna, livros de arte importados, etc. Infelizmente, no pós-guerra, o frágil mundo editorial português foi sacudido por uma crise que afetou profundamente a Ática. 

 

Morte misteriosa

Decorridos escassos quatro meses do início do novo projeto comercial, a 2 de março de 1947, pelas 12 horas, junto à Estação Fluvial de Belém, foi visto o automóvel Opel, usado pela família nos seus passeios dominicais, a cair ao Tejo, perante a impotência das testemunhas que viram os seus ocupantes a debater-se aflitivamente no seu interior. Quando finalmente foi retirado do rio, já estavam mortos os sinistrados: o casal Montalvor e o seu filho único, condutor do veículo (uma "estranha criatura", no dizer de Gaspar Simões).

Desconhecem-se os motivos da tragédia. Segundo Gaspar Simões teria sido um suicídio coletivo, motivado por dificuldades financeiras ou por algum drama familiar, aludindo a "histórias equívocas" que na época circulavam pelos maledicentes cafés lisboetas, a respeito de Montalvor e dos seus familiares.

No entanto, segundo o Diário de Lisboa desse mesmo dia, poderá ter-se tratado de um lamentável acidente. Foram os jornalistas desse diário que se dirigiram à morada na família, um enorme casarão na rua Garcia da Orta, nº 59, em Santos-o-Velho, e deram a triste notícia às duas jovens criadas, que ficaram estupefactas e tomadas pela dor. Segundo elas, nessa manhã, a patroa ter-lhes-ia recomendado que tivessem o almoço pronto para as 13.30 e o filho teria falado ao telefone com António Sérgio, combinando um jantar para essa noite. Além disso, no interior do veículo foi encontrado um saco com géneros alimentícios. As criadas apenas conheciam da família das vítimas uma tia muito idosa, Cândida da Silva Ramos.

Um técnico, citado pelo Diário de Lisboa de 3 de março, referiu que aquele modelo de carro teria o pedal do acelerador muito próximo do pedal do travão e que alguém que usasse calçado largo poderia muito bem ter momentaneamente acelerado o veículo em vez de o travar. Os cadáveres estiveram para ser autopsiados, mas houve dispensa, a instâncias de amigos da família. No dia 5, foi celebrada missa na igreja dos Mártires, e o enterro foi no cemitério dos Prazeres. Nesse mesmo dia foi realizada uma peritagem ao automóvel.

   
  

 

ENTARDECER

Sol-posto ungindo o mar: incensos de ouro!

Recolhe funda a tarde em sonho e mágoa.
Surdina fluida: anda o silêncio a orar –
E há crepúsculos de asas e, na água,
O céu é mármore extático a cismar!

E nas faces marmóreas dos rochedos
Esboçam-se perfis,
- Cintilações,
Penumbra de segredos!

Ó painéis de nuvens sobre a terra,
Ogivas delirantes
Na água refractando…
Encheis de sombra o mar de espumas rasas,
Iniciando
A hora pânica das asas!

E, à meia luz da tarde,
Na areia requeimada,
São vultos sonolentos
As proas dos navios…

Ó tristeza dos balões
Iluminando,
Na água prateada,
Os pegos e baixios…

Dormentes constelações
Que, em fundos lacustres
E musgosos,
Pondes reverberações
Em nossos olhos ansiosos.

Ó tardes de aquático esplendor,
Descendo em meu olhar!

Num sonho de regresso,
Numa ânsia de voltar,
Em mim todo me esqueço
E fico-me a cismar.

A tarde é toda um sonho moribundo.
É já olor da cor que amorteceu.
O céu vive no mar: sono profundo.
A asa do rumor no ar adormeceu!
 

Luís de Montalvor

quinta-feira, outubro 12, 2023

Saudade de Ruy Cinatti...


 

Linha de Rumo
  
 
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em meu redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
 
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campo de flores
E silvas...
 
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
  
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado,
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
   
  
Ruy Cinatti

quarta-feira, março 08, 2023

O poeta, geólogo, meteorologista e crítico musical José Blanc de Portugal nasceu há 109 anos

(imagem daqui)
    
D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos diretivos na sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que lecionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo posteriormente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respetivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.
Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernando Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em, por ordem de publicação: francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.
  

 

Ode a Lisboa


Ó cidade, ó miséria
Ó tudo que entediava
Meus dias perdidos no teu ventre
Ó tristeza, ó mesquinhez cativa
Ó perdidos passos meus cansados
Ó noites sem noite nem dia
Ó dias iguais às noites
Sem esperança de outros melhor haver
Ou, pior, esperando alguém que não havia
Ó cidade, ó meus amigos idos
(tive-os eu ao menos como tal um dia dia?)
Ó cansaço de tudo igual a chuva e o céu azul imenso
Igual em toda a volta, meses de calor,
Ou água suspensa, nuvens indistintas
Ou cordas de chuva a não poupar-me!
Igual, igual, igual por toda a banda
Ó miséria de sempre!
Tua miséria, ó cidade
Minha miséria igual em tudo
Igual às tuas ruas cheias
Igual às tuas ruas desertas
Igual às tuas ruas de dia
Igual às tuas ruas de noite
Igual à dos teus grandes
E das tuas prostitutas
Igual às dos teus homens corrompidos
E,
piormente igual à dos teus sábios!

Ó cidade igual inigualada
Por que te chamo perdidamente igual?

Tua miséria não é miséria,
Tua tristeza não é tristeza
Tudo que me perdeste para ti não é perdido:
Meus passos firmaram-te as pedras;
Tuas noites foram o meu sol;
Teus dias me foram descanso...
Iguais, dias, noites, minha desesperança
Era o próprio esperar doutras certezas:
A certeza de só poder tornar-se
O alguém que é forçoso haver!

Os meus amigos idos
Por tal seriam por certo perdidos
Sei — como não? que existiram:
Lá estão.

Ó cidade! o cansaço seguiu-me
— não era teu.
Igual o tempo está comigo
— não era teu...
Igual, igual, igual por toda a banda. . .
A miséria, o desalento aqui os tenho
— Também não eram teus.

Mas a gente era tua e eu também.
Lá ficou; e eu,
Ó cidade, ó miséria,
Ó tudo que me entediava,
Meus dias perdidos no teu ventre!...
Sei que nada me pertence
É tudo teu!
E eu me glorifico por eu e os meus
Sermos só de ti que és de Deus!

 

José Blanc de Portugal

Ruy Cinatti nasceu há 108 anos

(imagem daqui)
    
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
    

   

  

Linha de Rumo
  
 
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em meu redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
 
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campo de flores
E silvas...
 
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
  
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado,
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
   
  
Ruy Cinatti

terça-feira, janeiro 31, 2023

Luis de Montalvor nasceu há 132 anos



Luís de Montalvor (S. Vicente, Cabo Verde, 31 de janeiro de 1891 - Lisboa, 2 de março de 1947), pseudónimo de Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, poeta e editor português
 
Vida

Filho de um magistrado, aos dois meses de idade foi viver para Lisboa. Aí fez os seus estudos e iniciou a sua atividade cultural. Fundou as revistas Orpheu, em 1915, e Centauro, em 1916, e foi colaborador das revistas Atlântida (1915-1920), Contemporânea (1915-1926) e Sudoeste (1935).

Em 1933, fundou a "Editorial Ática, Lda.", com sede numa pequena loja na rua das Chagas, em Lisboa, e que a partir dos anos 40 adotou a firma de "Ática, S.A.R.L., Casa Editora".

Pouco depois da morte de Fernando Pessoa, foi Luís de Montalvor quem convenceu a família do então quase desconhecido poeta (até aí só haviam sido publicados poemas avulsos em revistas de pequena circulação e a Mensagem em livro) do valor imenso da sua obra, praticamente inédita. Os herdeiros de Pessoa confiaram então a Montalvor e a João Gaspar Simões a tarefa de inventariar o espólio literário que o escritor deixara guardado numa arca, fechada no seu quarto do apartamento da Rua Coelho da Rocha.

Durante os anos seguintes, os dois escritores, paciente e graciosamente, organizaram os manuscritos pessoanos, tendo em 1942 sido publicado pela editora Ática as Poesias de Fernando Pessoa, primeiro dos cinco volumes constituintes das Obras Completas de Fernando Pessoa – sendo os restantes: Poesias de Álvaro de Campos (1944), Odes de Ricardo Reis (1945), Mensagem (1945) e Poemas de Alberto Caeiro (1946).

Segundo Gaspar Simões, instigado por sócios mais ambiciosos, Montalvor em dezembro de 1946, inaugurou, na rua Garrett nº 2, em pleno Chiado, as instalações luxuosas e ampliadas da editora-livraria, com espaços para conferências e exposições de arte moderna, livros de arte importados, etc. Infelizmente, no pós-guerra, o frágil mundo editorial português foi sacudido por uma crise que afetou profundamente a Ática. 

 

Morte misteriosa

Decorridos escassos quatro meses do início do novo projeto comercial, a 2 de março de 1947, pelas 12 horas, junto à Estação Fluvial de Belém, foi visto o automóvel Opel, usado pela família nos seus passeios dominicais, a cair ao Tejo, perante a impotência das testemunhas que viram os seus ocupantes a debater-se aflitivamente no seu interior. Quando finalmente foi retirado do rio, já estavam mortos os sinistrados: o casal Montalvor e o seu filho único, condutor do veículo (uma "estranha criatura", no dizer de Gaspar Simões).

Desconhecem-se os motivos da tragédia. Segundo Gaspar Simões teria sido um suicídio coletivo, motivado por dificuldades financeiras ou por algum drama familiar, aludindo a "histórias equívocas" que na época circulavam pelos maledicentes cafés lisboetas, a respeito de Montalvor e dos seus familiares.

No entanto, segundo o Diário de Lisboa desse mesmo dia, poderá ter-se tratado de um lamentável acidente. Foram os jornalistas desse diário que se dirigiram à morada na família, um enorme casarão na rua Garcia da Orta, nº 59, em Santos-o-Velho, e deram a triste notícia às duas jovens criadas, que ficaram estupefactas e tomadas pela dor. Segundo elas, nessa manhã, a patroa ter-lhes-ia recomendado que tivessem o almoço pronto para as 13.30 e o filho teria falado ao telefone com António Sérgio, combinando um jantar para essa noite. Além disso, no interior do veículo foi encontrado um saco com géneros alimentícios. As criadas apenas conheciam da família das vítimas uma tia muito idosa, Cândida da Silva Ramos.

Um técnico, citado pelo Diário de Lisboa de 3 de março, referiu que aquele modelo de carro teria o pedal do acelerador muito próximo do pedal do travão e que alguém que usasse calçado largo poderia muito bem ter momentaneamente acelerado o veículo em vez de o travar. Os cadáveres estiveram para ser autopsiados, mas houve dispensa, a instâncias de amigos da família. No dia 5, foi celebrada missa na igreja dos Mártires, e o enterro foi no cemitério dos Prazeres. Nesse mesmo dia, foi realizada uma peritagem ao automóvel.

   
  
 
   
   
TARDE

Ardente, morna, a tarde que calcina,
como em quadrante a sombra que descora,
morre − baixo relevo que domina −
como um sol que sobre saibros se demora.

Inunda a terra a vaga de ouro: fina
chuva de sonho. Paira, ao longe, e chora
o olhar errado ao sol que já declina
sobre as palmeiras que o deserto implora.

A um zodíaco de fogo a tarde abrasa,
em terra de varão que o olhar esmalta.
− Estagnante plaino de ouro e rosas − vaza

nele a sombra, sem dor, que em nós começa
e galga, sobe, monta e vive e exalta.
E a noite, a grande noite, recomeça!
 
   
   
Luís de Montalvor

quarta-feira, outubro 12, 2022

Ruy Cinatti morreu há trinta e seis anos

(imagem daqui)
   
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
   
 
Quando o amor morrer dentro de ti
  
 
Quando o amor morrer dentro de ti,
Caminha para o alto onde haja espaço,
E com o silêncio outrora pressentido
Molda em duas colunas os teus braços.
Relembra a confusão dos pensamentos,
E neles ateia o fogo adormecido
Que uma vez, sonho de amor, teu peito ferido
Espalhou generoso aos quatro ventos.
Aos que passarem dá-lhes o abrigo
E o nocturno calor que se debruça
Sobre as faces brilhantes de soluços.
E se ninguém vier, ergue o sudário
Que mil saudosas lágrimas velaram;
Desfralda na tua alma o inventário
Do templo onde a vida ora de bruços
A Deus e aos sonhos que gelaram.
  
 
in Obra Poética - Ruy Cinatti

terça-feira, março 08, 2022

José Blanc de Portugal (poeta, geólogo, meteorologista e crítico musical) nasceu há 108 anos

(imagem daqui)
    
D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos diretivos na sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que lecionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo posteriormente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respectivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.
Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernado Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em, por ordem de publicação: francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.
  

 

Ode a Lisboa


Ó cidade, ó miséria
Ó tudo que entediava
Meus dias perdidos no teu ventre
Ó tristeza, ó mesquinhez cativa
Ó perdidos passos meus cansados
Ó noites sem noite nem dia
Ó dias iguais às noites
Sem esperança de outros melhor haver
Ou, pior, esperando alguém que não havia
Ó cidade, ó meus amigos idos
(tive-os eu ao menos como tal um dia dia?)
Ó cansaço de tudo igual a chuva e o céu azul imenso
Igual em toda a volta, meses de calor,
Ou água suspensa, nuvens indistintas
Ou cordas de chuva a não poupar-me!
Igual, igual, igual por toda a banda
Ó miséria de sempre!
Tua miséria, ó cidade
Minha miséria igual em tudo
Igual às tuas ruas cheias
Igual às tuas ruas desertas
Igual às tuas ruas de dia
Igual às tuas ruas de noite
Igual à dos teus grandes
E das tuas prostitutas
Igual às dos teus homens corrompidos
E,
piormente igual à dos teus sábios!

Ó cidade igual inigualada
Por que te chamo perdidamente igual?

Tua miséria não é miséria,
Tua tristeza não é tristeza
Tudo que me perdeste para ti não é perdido:
Meus passos firmaram-te as pedras;
Tuas noites foram o meu sol;
Teus dias me foram descanso...
Iguais, dias, noites, minha desesperança
Era o próprio esperar doutras certezas:
A certeza de só poder tornar-se
O alguém que é forçoso haver!

Os meus amigos idos
Por tal seriam por certo perdidos
Sei — como não? que existiram:
Lá estão.

Ó cidade! o cansaço seguiu-me
— não era teu.
Igual o tempo está comigo
— não era teu...
Igual, igual, igual por toda a banda. . .
A miséria, o desalento aqui os tenho
— Também não eram teus.

Mas a gente era tua e eu também.
Lá ficou; e eu,
Ó cidade, ó miséria,
Ó tudo que me entediava,
Meus dias perdidos no teu ventre!...
Sei que nada me pertence
É tudo teu!
E eu me glorifico por eu e os meus
Sermos só de ti que és de Deus!

O poeta Ruy Cinatti nasceu há 107 anos

(imagem daqui)
    
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
    

   

  

Linha de Rumo
  
 
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em meu redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
 
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campo de flores
E silvas...
 
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
  
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado,
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
   
  
Ruy Cinatti

segunda-feira, janeiro 31, 2022

O poeta Luis de Montalvor nasceu há 131 anos



Luís de Montalvor (S. Vicente, Cabo Verde, 31 de janeiro de 1891 - Lisboa, 2 de março de 1947), pseudónimo de Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, poeta e editor português
 
Vida

Filho de um magistrado, aos dois meses de idade foi viver para Lisboa. Aí fez os seus estudos e iniciou a sua atividade cultural. Fundou as revistas Orpheu, em 1915, e Centauro, em 1916, e foi colaborador das revistas Atlântida (1915-1920), Contemporânea (1915-1926) e Sudoeste (1935).

Em 1933, fundou a "Editorial Ática, Lda.", com sede numa pequena loja na rua das Chagas, em Lisboa, e que a partir dos anos 40 adotou a firma de "Ática, S.A.R.L., Casa Editora".

Pouco depois da morte de Fernando Pessoa, foi Luís de Montalvor quem convenceu a família do então quase desconhecido poeta (até aí só haviam sido publicados poemas avulsos em revistas de pequena circulação e a Mensagem em livro) do valor imenso da sua obra, praticamente inédita. Os herdeiros de Pessoa confiaram então a Montalvor e a João Gaspar Simões a tarefa de inventariar o espólio literário que o escritor deixara guardado numa arca, fechada no seu quarto do apartamento da Rua Coelho da Rocha.

Durante os anos seguintes, os dois escritores, paciente e graciosamente, organizaram os manuscritos pessoanos, tendo em 1942 sido publicado pela editora Ática as Poesias de Fernando Pessoa, primeiro dos cinco volumes constituintes das Obras Completas de Fernando Pessoa – sendo os restantes: Poesias de Álvaro de Campos (1944), Odes de Ricardo Reis (1945), Mensagem (1945) e Poemas de Alberto Caeiro (1946).

Segundo Gaspar Simões, instigado por sócios mais ambiciosos, Montalvor em dezembro de 1946, inaugurou, na rua Garrett nº 2, em pleno Chiado, as instalações luxuosas e ampliadas da editora-livraria, com espaços para conferências e exposições de arte moderna, livros de arte importados, etc. Infelizmente, no pós-guerra, o frágil mundo editorial português foi sacudido por uma crise que afetou profundamente a Ática. 

 

Morte misteriosa

Decorridos escassos quatro meses do início do novo projecto comercial, a 2 de março de 1947, pelas 12 horas, junto à Estação Fluvial de Belém, foi visto o automóvel Opel, usado pela família nos seus passeios dominicais, a cair ao Tejo, perante a impotência das testemunhas que viram os seus ocupantes a debater-se aflitivamente no seu interior. Quando finalmente foi retirado do rio, já estavam mortos os sinistrados: o casal Montalvor e o seu filho único, condutor do veículo (uma "estranha criatura", no dizer de Gaspar Simões).

Desconhecem-se os motivos da tragédia. Segundo Gaspar Simões teria sido um suicídio coletivo, motivado por dificuldades financeiras ou por algum drama familiar, aludindo a "histórias equívocas" que na época circulavam pelos maledicentes cafés lisboetas, a respeito de Montalvor e dos seus familiares.

No entanto, segundo o Diário de Lisboa desse mesmo dia, poderá ter-se tratado de um lamentável acidente. Foram os jornalistas desse diário que se dirigiram à morada na família, um enorme casarão na rua Garcia da Orta, nº 59, em Santos-o-Velho, e deram a triste notícia às duas jovens criadas, que ficaram estupefactas e tomadas pela dor. Segundo elas, nessa manhã, a patroa ter-lhes-ia recomendado que tivessem o almoço pronto para as 13.30 e o filho teria falado ao telefone com António Sérgio, combinando um jantar para essa noite. Além disso, no interior do veículo foi encontrado um saco com géneros alimentícios. As criadas apenas conheciam da família das vítimas uma tia muito idosa, Cândida da Silva Ramos.

Um técnico, citado pelo Diário de Lisboa de 3 de março, referiu que aquele modelo de carro teria o pedal do acelerador muito próximo do pedal do travão e que alguém que usasse calçado largo poderia muito bem ter momentaneamente acelerado o veículo em vez de o travar. Os cadáveres estiveram para ser autopsiados, mas houve dispensa disso, a instâncias de amigos da família. No dia 5, foi celebrada missa na igreja dos Mártires, e o enterro foi no cemitério dos Prazeres. Nesse mesmo dia, foi realizada uma peritagem ao automóvel.

   
  
 
   
   
TARDE

Ardente, morna, a tarde que calcina,
como em quadrante a sombra que descora,
morre − baixo relevo que domina −
como um sol que sobre saibros se demora.

Inunda a terra a vaga de ouro: fina
chuva de sonho. Paira, ao longe, e chora
o olhar errado ao sol que já declina
sobre as palmeiras que o deserto implora.

A um zodíaco de fogo a tarde abrasa,
em terra de varão que o olhar esmalta.
− Estagnante plaino de ouro e rosas − vaza

nele a sombra, sem dor, que em nós começa
e galga, sobe, monta e vive e exalta.
E a noite, a grande noite, recomeça!
 
   
   
Luís de Montalvor

segunda-feira, março 08, 2021

José Blanc de Portugal, o poeta, geólogo, meteorologista e crítico musical, nasceu há 107 anos

(imagem daqui)
    
D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos directivos na sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que leccionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo actualmente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respectivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.
Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernado Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em (por ordem de publicação) francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.
  

 

Ode a Lisboa


Ó cidade, ó miséria
Ó tudo que entediava
Meus dias perdidos no teu ventre
Ó tristeza, ó mesquinhez cativa
Ó perdidos passos meus cansados
Ó noites sem noite nem dia
Ó dias iguais às noites
Sem esperança de outros melhor haver
Ou, pior, esperando alguém que não havia
Ó cidade, ó meus amigos idos
(tive-os eu ao menos como tal um dia dia?)
Ó cansaço de tudo igual a chuva e o céu azul imenso
Igual em toda a volta, meses de calor,
Ou água suspensa, nuvens indistintas
Ou cordas de chuva a não poupar-me!
Igual, igual, igual por toda a banda
Ó miséria de sempre!
Tua miséria, ó cidade
Minha miséria igual em tudo
Igual às tuas ruas cheias
Igual às tuas ruas desertas
Igual às tuas ruas de dia
Igual às tuas ruas de noite
Igual à dos teus grandes
E das tuas prostitutas
Igual às dos teus homens corrompidos
E,
piormente igual à dos teus sábios!

Ó cidade igual inigualada
Por que te chamo perdidamente igual?

Tua miséria não é miséria,
Tua tristeza não é tristeza
Tudo que me perdeste para ti não é perdido:
Meus passos firmaram-te as pedras;
Tuas noites foram o meu sol;
Teus dias me foram descanso...
Iguais, dias, noites, minha desesperança
Era o próprio esperar doutras certezas:
A certeza de só poder tornar-se
O alguém que é forçoso haver!

Os meus amigos idos
Por tal seriam por certo perdidos
Sei — como não? que existiram:
Lá estão.

Ó cidade! o cansaço seguiu-me
— não era teu.
Igual o tempo está comigo
— não era teu...
Igual, igual, igual por toda a banda. . .
A miséria, o desalento aqui os tenho
— Também não eram teus.

Mas a gente era tua e eu também.
Lá ficou; e eu,
Ó cidade, ó miséria,
Ó tudo que me entediava,
Meus dias perdidos no teu ventre!...
Sei que nada me pertence
É tudo teu!
E eu me glorifico por eu e os meus
Sermos só de ti que és de Deus!

Ruy Cinatti nasceu há 106 anos

(imagem daqui)
    
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
   

 

Linha de Rumo
  
 
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Encontro-me parado...
Olho em meu redor e vejo inacabado
O meu mundo melhor.
 
Tanto tempo perdido...
Com que saudade o lembro e o bendigo:
Campo de flores
E silvas...
 
Fonte da vida fui. Medito. Ordeno.
Penso o futuro a haver.
E sigo deslumbrado o pensamento
Que se descobre.
  
Quem não me deu Amor, não me deu nada.
Desterrado,
Desterrado prossigo.
E sonho-me sem Pátria e sem Amigos,
Adrede.
   
  
Ruy Cinatti

domingo, janeiro 31, 2021

Luis de Montalvor nasceu há cento e trinta anos



Luís de Montalvor (S. Vicente, Cabo Verde, 31 de janeiro de 1891 - Lisboa, 2 de março de 1947), pseudónimo de Luís Filipe de Saldanha da Gama da Silva Ramos, poeta e editor português
 
Vida

Filho de um magistrado, aos dois meses de idade foi viver para Lisboa. Aí fez os seus estudos e iniciou a sua actividade cultural. Fundou as revistas Orpheu, em 1915, e Centauro, em 1916, e foi colaborador das revistas Atlântida (1915-1920), Contemporânea (1915-1926) e Sudoeste (1935).

Em 1933, fundou a "Editorial Ática, Lda.", com sede numa pequena loja na rua das Chagas, em Lisboa, e que a partir dos anos 40 adoptou a firma de "Ática, S.A.R.L., Casa Editora".

Pouco depois da morte de Fernando Pessoa, foi Luís de Montalvor quem convenceu a família do então quase desconhecido poeta (até aí só haviam sido publicados poemas avulsos em revistas de pequena circulação e a Mensagem em livro) do valor imenso da sua obra, praticamente inédita. Os herdeiros de Pessoa confiaram então a Montalvor e a João Gaspar Simões a tarefa de inventariar o espólio literário que o escritor deixara guardado numa arca, fechada no seu quarto do apartamento da Rua Coelho da Rocha.

Durante os anos seguintes, os dois escritores, paciente e graciosamente, organizaram os manuscritos pessoanos, tendo em 1942 sido publicado pela editora Ática as Poesias de Fernando Pessoa, primeiro dos cinco volumes constituintes das Obras Completas de Fernando Pessoa – sendo os restantes: Poesias de Álvaro de Campos (1944), Odes de Ricardo Reis (1945), Mensagem (1945) e Poemas de Alberto Caeiro (1946).

Segundo Gaspar Simões, instigado por sócios mais ambiciosos, Montalvor em dezembro de 1946, inaugurou, na rua Garrett nº 2, em pleno Chiado, as instalações luxuosas e ampliadas da editora-livraria, com espaços para conferências e exposições de arte moderna, livros de arte importados, etc. Infelizmente, no pós-guerra, o frágil mundo editorial português foi sacudido por uma crise que afectou profundamente a Ática. 

 

Morte misteriosa

Decorridos escassos quatro meses do início do novo projecto comercial, a 2 de março de 1947, pelas 12 horas, junto à Estação Fluvial de Belém, foi visto o automóvel Opel, usado pela família nos seus passeios dominicais, a cair ao Tejo, perante a impotência das testemunhas que viram os seus ocupantes a debater-se aflitivamente no seu interior. Quando finalmente foi retirado do rio, já estavam mortos os sinistrados: o casal Montalvor e o seu filho único, condutor do veículo (uma "estranha criatura", no dizer de Gaspar Simões).

Desconhecem-se os motivos da tragédia. Segundo Gaspar Simões teria sido um suicídio colectivo, motivado por dificuldades financeiras ou por algum drama familiar, aludindo a "histórias equívocas" que na época circulavam pelos maledicentes cafés lisboetas, a respeito de Montalvor e dos seus familiares.

No entanto, segundo o Diário de Lisboa desse mesmo dia, poderá ter-se tratado de um lamentável acidente. Foram os jornalistas desse diário que se dirigiram à morada na família, um enorme casarão na rua Garcia da Orta, nº 59, em Santos-o-Velho, e deram a triste notícia às duas jovens criadas, que ficaram estupefactas e tomadas pela dor. Segundo elas, nessa manhã, a patroa ter-lhes-ia recomendado que tivessem o almoço pronto para as 13.30 e o filho teria falado ao telefone com António Sérgio, combinando um jantar para essa noite. Além disso, no interior do veículo foi encontrado um saco com géneros alimentícios. As criadas apenas conheciam da família das vítimas uma tia muito idosa, Cândida da Silva Ramos.

Um técnico, citado pelo Diário de Lisboa de 3 de Março, referiu que aquele modelo de carro teria o pedal do acelerador muito próximo do pedal do travão e que alguém que usasse calçado largo poderia muito bem ter momentaneamente acelerado o veículo em vez de o travar. Os cadáveres estiveram para ser autopsiados, mas houve dispensa disso, a instâncias de amigos da família. No dia 5, foi celebrada missa na igreja dos Mártires, e o enterro foi no cemitério dos Prazeres. Nesse mesmo dia, foi realizada uma peritagem ao automóvel.

   
  
 
   
   
TARDE

Ardente, morna, a tarde que calcina,
como em quadrante a sombra que descora,
morre − baixo relevo que domina −
como um sol que sobre saibros se demora.

Inunda a terra a vaga de ouro: fina
chuva de sonho. Paira, ao longe, e chora
o olhar errado ao sol que já declina
sobre as palmeiras que o deserto implora.

A um zodíaco de fogo a tarde abrasa,
em terra de varão que o olhar esmalta.
− Estagnante plaino de ouro e rosas − vaza

nele a sombra, sem dor, que em nós começa
e galga, sobe, monta e vive e exalta.
E a noite, a grande noite, recomeça!
   
   
Luís de Montalvor

domingo, março 08, 2020

Ruy Cinatti nasceu há 105 anos

(imagem daqui)
   
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
   
 
Quando o amor morrer dentro de ti
  
 
Quando o amor morrer dentro de ti,
Caminha para o alto onde haja espaço,
E com o silêncio outrora pressentido
Molda em duas colunas os teus braços.
Relembra a confusão dos pensamentos,
E neles ateia o fogo adormecido
Que uma vez, sonho de amor, teu peito ferido
Espalhou generoso aos quatro ventos.
Aos que passarem dá-lhes o abrigo
E o nocturno calor que se debruça
Sobre as faces brilhantes de soluços.
E se ninguém vier, ergue o sudário
Que mil saudosas lágrimas velaram;
Desfralda na tua alma o inventário
Do templo onde a vida ora de bruços
A Deus e aos sonhos que gelaram.
  
 
in Obra Poética - Ruy Cinatti

sexta-feira, março 08, 2019

O poeta Ruy Cinatti nasceu há 104 anos

(imagem daqui)
  
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de março de 1915 - Lisboa, 12 de outubro de 1986) foi um poeta, antropólogo e agrónomo português.
  
Ruy Cinatti escreveu sobre São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940).
A 10 de junho de 1992 foi agraciado, a título póstumo, com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
   
 
Quando o Amor Morrer Dentro de Ti
  
Quando o amor morrer dentro de ti,
Caminha para o alto onde haja espaço,
E com o silêncio outrora pressentido
Molda em duas colunas os teus braços.
Relembra a confusão dos pensamentos,
E neles ateia o fogo adormecido
Que uma vez, sonho de amor, teu peito ferido
Espalhou generoso aos quatro ventos.
Aos que passarem dá-lhes o abrigo
E o nocturno calor que se debruça
Sobre as faces brilhantes de soluços.
E se ninguém vier, ergue o sudário
Que mil saudosas lágrimas velaram;
Desfralda na tua alma o inventário
Do templo onde a vida ora de bruços
A Deus e aos sonhos que gelaram.

Ruy Cinatti

O poeta que era geólogo, meteorologista, crítico musical e especialista em muitas coisas nasceu há 105 anos

(imagem daqui)
 
D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de Assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos directivos na Sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que leccionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo actualmente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respectivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.
Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernado Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em (por ordem de publicação) francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.
  
 
  
Poeta e crítico musical, licenciado em Ciências Geológicas pela Universidade de Lisboa, cursou também História da Música e Psicologia. Desempenhou a função de meteorologista do Serviço Meteorológico Nacional, cujos centros dirigiu em Lisboa, Ilha do Sal, Santa Maria dos Açores, Ponta Delgada, Luanda e Moçambique. Além de obras sobre a sua profissão, publicou trabalhos de crítica musical e traduções de diversos autores: Truman Capote, Gilbert Keith Chesterton, Carlo Coccioli, T. S. Eliot, Cristopher Fry, Jung, Pitágoras, Shakespeare, Fernando Pessoa. Colaborou em algumas das mais representativas publicações poéticas dos anos 50, nomeadamente, Aventura, Graal, A Serpente, Litoral e Tempo Presente. Co-dirigiu, em 1940, com Tomás Kim e Ruy Cinatti, Cadernos de Poesia, publicação eclética que, subordinada ao lema "Poesia é só uma", apresentava como objetivo "arquivar a atividade da poesia atual sem dependência de escolas ou grupos literários, estéticas ou doutrinas, fórmulas ou programas; e em cuja segunda série (Lisboa, 1951) subscreve, ao lado de Jorge de Sena, Ruy Cinatti e José-Augusto França, uma conceção de poesia que "com todos os seus ingredientes, recursos, apelos aos sentidos, resulta de um compromisso firmado entre um ser humano e o seu tempo, entre uma personalidade e uma sua consciência sensível do mundo, que mutuamente se definem" e de poeta como "homem destinado a nele se definir a humanidade. Um ser capaz de ter todo o passado íntegro no presente e capaz de transformar o presente integralmente em futuro", através de uma "atitude de lucidez, compreensão e independência." Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e distinguido com a medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura.
 

Oração Final
  Poesia! Sem esperar voltei meu canto que é teu
As coisas de meu Pai que são as pobres criaturas
Caminhando a par de mim pelas ruas da amargura
Disfarçando mais do que eu a certeza que as leis tuas
Nada têm que ver com a minha piedade de evitarem
Cada maior dor seguindo à menos dura.
Deus Pai pudesse eu como Vosso Filho
Como irmão de Cristo, imolar-se só sem perder alguém
— Sem ter que fechar ouvidos ao Espírito Vosso
Cada instante inundando-me de luz! —
Sem vós tudo é impossível.
Sem mim tudo seria igual,
Mas fazei que meus iguais
Não sejam como eu tão miseráveis:
Crendo em Vós, sabendo-vos as provas,
mostro-me pior que os que vos esquecem!
  A vossa Lei, a vossa marca não se
apagou de cada poro da minha pele
Dai-me a força de ajudar a todos com
um sopro do teu Ser que bastará
Pra todos e pra mim.
  Fico na angústia da vossa perdida Graça.
Perdoai-me! Perdoai como eu devo perdoar!!
Fazei que eu perdoe!
Fazei-nos os Santos que Vos devemos!
 

José Blanc de Portugal

sábado, março 08, 2014

O poeta que era geólogo, meteorologista, crítico musical e especialista em muitas coisas nasceu há um século

(imagem daqui)

D. José Bernardino Blanc de Portugal nasceu em Lisboa em 8 de março de 1914 e faleceu em 5 de maio de 2000. Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que lhe concedeu o título de Assistente-extraordinário. Cursou História da Música e Língua e Literatura Árabe, frequentando também cadeiras de Psicologia. Meteorologista da Pan American Airways, passou ao Serviço Meteorológico Nacional, onde desempenhou cargos directivos na Sede, Açores, Cabo Verde, Angola e Moçambique. Representou o país em reuniões técnicas da Organização Mundial de Aviação Civil e da Organização Meteorológica Mundial, em que foi vice-presidente da Associação Regional I (África). Nomeado Adido Cultural junto da Embaixada de Portugal em Brasília, pediu exoneração do cargo para assumir a vice-presidência do Instituto da Cultura Portuguesa. Desde os quinze anos que leccionou particularmente todas as cadeiras do curso liceal e algumas universitárias. Foi professor de Integração Cultural e Sociologia da Informação nos cursos de Formação Artística da Sociedade Nacional de Belas Artes. Desde os vinte anos que exerceu crítica musical, eventualmente de bailado, sendo actualmente crítico musical do Diário de Notícias. Foi membro do Conselho das Ordens Nacionais, do Conselho Português da Música e do Conselho Português da Dança, filiados nos respectivos Conselhos Internacionais da UNESCO. Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura (Mérito Linguístico e Filológico). Fundador dos Cadernos de Poesia, com Ruy Cinatti e Tomaz Kim, aos quais, mais tarde, se associaram Jorge de Sena e José Augusto França.

Obras – Poesia: Parva Naturalia (Prémio Fernando Pessoa), 1960; O Espaço Prometido, 1960; Odes Pedestres, (Prémio Casa da Imprensa), 1965; Descompasso, 1986; Enéadas, 1959. Prémio do P.E.N. Club Português, pelo livro e pelo conjunto da obra. Ensaio: Anticrítico, 1960; Quatro Novíssimos da Música Actual, 1962. Traduções: de Shakespeare; T.S. Eliot, Christopher Fry, (Teatro); Pratolini, Coccioli, Truman Capote e Fernado Pessoa (The Mad Fiddler). Tem poemas seus traduzidos em (por ordem de publicação) francês, espanhol, inglês, alemão e sueco.


Poeta e crítico musical, licenciado em Ciências Geológicas pela Universidade de Lisboa, cursou também História da Música e Psicologia. Desempenhou a função de meteorologista do Serviço Meteorológico Nacional, cujos centros dirigiu em Lisboa, Ilha do Sal, Santa Maria dos Açores, Ponta Delgada, Luanda e Moçambique. Além de obras sobre a sua profissão, publicou trabalhos de crítica musical e traduções de diversos autores: Truman Capote, Gilbert Keith Chesterton, Carlo Coccioli, T. S. Eliot, Cristopher Fry, Jung, Pitágoras, Shakespeare, Fernando Pessoa. Colaborou em algumas das mais representativas publicações poéticas dos anos 50, nomeadamente, Aventura, Graal, A Serpente, Litoral e Tempo Presente. Co-dirigiu, em 1940, com Tomás Kim e Ruy Cinatti, Cadernos de Poesia, publicação eclética que, subordinada ao lema "Poesia é só uma", apresentava como objetivo "arquivar a atividade da poesia atual sem dependência de escolas ou grupos literários, estéticas ou doutrinas, fórmulas ou programas; e em cuja segunda série (Lisboa, 1951) subscreve, ao lado de Jorge de Sena, Ruy Cinatti e José-Augusto França, uma conceção de poesia que "com todos os seus ingredientes, recursos, apelos aos sentidos, resulta de um compromisso firmado entre um ser humano e o seu tempo, entre uma personalidade e uma sua consciência sensível do mundo, que mutuamente se definem" e de poeta como "homem destinado a nele se definir a humanidade. Um ser capaz de ter todo o passado íntegro no presente e capaz de transformar o presente integralmente em futuro", através de uma "atitude de lucidez, compreensão e independência." Comendador da Ordem do Infante D. Henrique e distinguido com a medalha Oskar Nobiling, da Sociedade Brasileira de Língua e Literatura.


Oração Final

Poesia! Sem esperar voltei meu canto que é teu
As coisas de meu Pai que são as pobres criaturas
Caminhando a par de mim pelas ruas da amargura
Disfarçando mais do que eu a certeza que as leis tuas
Nada têm que ver com a minha piedade de evitarem
Cada maior dor seguindo à menos dura.
Deus Pai pudesse eu como Vosso Filho
Como irmão de Cristo, imolar-se só sem perder alguém
— Sem ter que fechar ouvidos ao Espírito Vosso
Cada instante inundando-me de luz! —
Sem vós tudo é impossível.
Sem mim tudo seria igual,
Mas fazei que meus iguais
Não sejam como eu tão miseráveis:
Crendo em Vós, sabendo-vos as provas,
mostro-me pior que os que vos esquecem!

A vossa Lei, a vossa marca não se
apagou de cada poro da minha pele
Dai-me a força de ajudar a todos com
um sopro do teu Ser que bastará
Pra todos e pra mim.

Fico na angústia da vossa perdida Graça.
Perdoai-me! Perdoai como eu devo perdoar!!
Fazei que eu perdoe!
Fazei-nos os Santos que Vos devemos!


José Blanc de Portugal